Stephen KingEm 1986*, o já fenomenal escritor norte-americano Stephen King publicou na revista The Writer um ensaio sobre como se tornar um escritor de sucesso… em 10 minutos. Pretensioso, não?

Para celebrar o lançamento do livro Sobre a Escrita – A Arte em Memória no Brasil, o Escriba Encapuzado traz o ensaio devidamente traduzido. Na primeira parte, publicada ontem, King revela como despertou para sua vocação.

A segunda parte você confere agora: o Mestre do Terror e do Suspense (e também da Fantasia, por que não?) apresenta conselhos que prometem transformar aspirantes atenciosos em escritores de sucesso.

Confira agora as 12 dicas de Stephen King para escritores iniciantes.

Tudo o que você precisa saber sobre escrever com sucesso: em dez minutos (Parte 2)
por Stephen King

Então aqui está, sem lenga-lenga. Levará 10 minutos para ler, e tudo pode ser aplicado agora mesmo… se você escutar.

1.  Seja talentoso

Este, claro, é o matador. O que é talento?, eu escuto alguém bradando, e aqui estamos nós, prontos para entrar em uma discussão equivalente a de “qual é o sentido da vida”? repleta de declarações pomposas e inutilidade total. Para os propósitos do escritor iniciante, talento pode muito bem ser definido como sucesso eventual – publicação e dinheiro. Se você escreveu algo pelo qual alguém lhe enviou um cheque, se você o cheque tinha fundos e você o descontou, e se você pagou a conta de luz com o dinheiro, eu te considero talentoso.

Stephen King

“Cadê aquele anormal bronco e ganancioso?”

Agora alguns de vocês já estão berrando. Alguns de vocês estão me chamando de anormal bronco e ganancioso. E alguns de vocês estão me chamando por palavrões. Você está dizendo que Harold Robbins é talentoso?, guincha alguém num dos Grandes Departamentos de Inglês da América. V.C. Andrews? Theodore Dreiser? E quanto à você, seu palerma disléxico?

Absurdo. Pior que absurdo, descontextualizado. Não estamos falando de bom ou ruim aqui. Eu estou interessado em te contar como publicar suas coisas, não em julgamentos críticos de quem é bom ou ruim. Em regra, os julgamentos críticos chegam depois que o cheque é gasto, afinal. Tenho minhas próprias opiniões, mas a maior parte do tempo eu as mantenho para mim mesmo.

Pessoas que são publicadas regularmente e são pagas pelo que estão escrevendo podem ser santos ou diabretes, mas é claro que eles estão alcançando muito mais pessoas que querem o que eles oferecem. Logo, eles estão se comunicando. Logo, eles são talentosos. A maior parte de escrever com sucesso é ser talentoso, e no contexto do marketing, o único escritor ruim é aquele que não é pago. Se você não é talentoso, você não terá sucesso. E se você não está tendo sucesso, você deve saber quando desistir.

Quando é o momento? Não sei. É diferente para cada escritor. Não após escorregar em seis rejeições, certamente, nem após sessenta. Mas após seiscentas? Talvez. Após seis mil? Meu amigo, depois de seis mil canetadas vermelhas, já passou da hora de você tentar pintura ou programação de computadores.

Organização e Autocrítica2.  Seja organizado

Datilografe. Espaço duplo. Use um papel branco pesado bonito, nunca aquela coisa apagável de pele de cebola. Se você rasurou seu rascunho demais, faça outro.

3.  Seja autocritico

Se você não rasurou seu rascunho demais, você fez um trabalho porco. Apenas Deus acerta na primeira vez. Não seja preguiçoso.

4.  Remova cada palavra extrínseca

Você quer subir em um palanque e pregar? Ótimo. Arranje um e tente o parque local. Você quer escrever pelo dinheiro? Vá direto ao ponto. E se você remover todo o lixo excessivo e descobrir que não conseguiu chegar ao ponto, então rasgue o que escreveu e recomece… ou tente algo novo.

5.  Nunca leia um livro de referencia enquanto estiver trabalhando num primeiro rascunho

Você quer escrever uma história? Ótimo. Largue o dicionário, a enciclopédia, seu Almanaque Mundial e o tesauro. Melhor ainda, jogue o tesauro na lixeira. A única coisa mais assustadora do que um tesauro são aqueles livretos que universitários compram perto das provas por serem preguiçosos demais para ler os romances indicados. Qualquer palavra que você tenha que caçar no tesauro é a palavra errada. Não há exceções a essa regra.

Livros de biblioteca jogados na lixeiraVocê acha que pode ter errado alguma palavra? Tudo bem, eis as suas escolhas: procurar pela palavra no dicionário, assegurando-se de tê-la escrito corretamente – e em troca quebrar sua linha de pensamento e o arroubo de escritor– ou só soletrá-la foneticamente e corrigir depois.

Por que não? Você achou que estava indo a algum lugar? E se você precisar saber qual é a maior cidade do Brasil e perceber que não a tem em sua cabeça, por que não escrever em Miami ou Cleveland? Você pode conferir… mas depois. Quando você sentar para escrever, escreva. Não faça nada mais além de ir ao banheiro, e apenas quando for absolutamente inadiável.

6.  Conheça os mercados

Apenas alguém estúpido enviaria uma história sobre morcegos-vampiros gigantes assolando uma escolar para a revista McCall. Apenas alguém estúpido enviaria uma história tenra sobre mãe e filha acertando as diferenças na véspera de Natal para a Playboy… mas sempre há quem faça isso. Não estou exagerando; vi essas histórias nas pilhas de baboseiras de revistas atuais.

Se você escreve uma boa história, por que enviá-la de modo boçal? Você mandaria sua criança para fora numa tempestade de neve vestindo bermudas e uma camiseta sem mangas? Se você gosta de ficção científica, leia revistas do gênero. Se você quer escrever histórias de confissão, leia revistas do gênero. E por aí vai.

Não se trata apenas de conhecer o que é cabe na história atual; com o tempo você pode começar a perceber ritmos gerais, gostos e aversões editoriais, toda a inclinação da revista. Às vezes as leituras podem influenciar sua próxima história e gerar uma venda.

7.  Escreva para entreter
Russell Crowe em cena do filme  "Gladiador"

“Não estão se divertindo?!”

Isso significa que você não pode escrever “ficção séria”? Não. Em algum lugar ao longo do caminho, críticos perniciosos passaram a impor aos leitores e escritores americanos a noção de que ficção de entretenimento e ideias sérias não se sobrepõem. Isso surpreenderia Charles Dickens, para não dizer Jane Austen, John Steinbeck, William Faulkner, Bernard Malamud, e centenas de outros. Mas suas ideias sérias devem sempre servir a sua história, não o contrário. Repito: se você quer pregar, arrume um palanque.

8.  Pergunte-se frequentemente, “Estou me divertindo?”

A resposta não precisa ser sempre sim. Mas se é sempre não, é hora de um novo projeto ou uma nova carreira.

9.  Como validar críticas

Mostre seu texto para um número de pessoas – dez, digamos. Ouça atentamente o que eles dizem. Sorria e acene muito. Em seguida, reveja o que foi dito com muita atenção. Se os seus críticos estão dizendo a mesma coisa sobre algum aspecto de sua história – uma reviravolta na história que não funciona, um personagem que soa falso, uma narrativa empolada, ou meia dúzia de outros possíveis –, mude esse aspecto.

Não importa se você realmente gostava da reviravolta de tal personagem; se um grande número de pessoas está dizendo que algo está errado com seu texto, então está. Se sete ou oito delas estão criticando a mesma coisa, eu ainda sugeriria mudá-la. Mas se todos – ou a grande maioria – criticou coisas diferentes, você pode desconsiderar o que todos dizem.

10.  Conheça todas as regras para a devida submissão

Porte de retorno, envelope auto-endereçado, essas coisas.

11.  Um agente? Esqueça. Por ora.
Agentes e Escritores

Quem nunca?

Agentes recebem 10% do dinheiro ganho por seus clientes. 10% de nada é nada. Agentes também precisam pagar aluguel. Escritores iniciantes não contribuem para isso nem para qualquer outra necessidade da vida. Venda suas histórias por conta própria. Se já concluiu um romance, envie cartas de apresentação para editores, um a um, acompanhadas de capítulos de amostra e/ou do original completo.

E lembre-se da Primeira Regra de Stephen King Sobre Escritores e Agentes, fruto de amarga experiência pessoal: você não precisa de um agente até que esteja ganhando o suficiente para alguém roubar… e se estiver ganhando tanto, você será capaz fazer uma seleção de bons agentes.

12.  Se for ruim, mate.

No que diz respeito a pessoas, assassinato por piedade é contra a lei. No que diz respeito a ficção, esta é a lei.

Isso é tudo o que você precisa saber. E se você ouviu, você pode escrever qualquer coisa que quiser. Agora creio que vou desejar-lhe um dia agradável e assinar.

Meus dez minutos acabaram.

* Acredita-se que o ensaio original tenha sido publicado em 1986 em uma das edições da The Writer Magazine e posteriormente republicado na edição de 1988 do The Writer’s Handbook. O texto é claramente a base do que se tornaria o livro Sobre a Escrita – A Arte em Memórias.

E aí, você achou válidas as dicas do Rei? Dê sua opinião nos comentários.

Para saber mais:

  1. Como Escrever com Sucesso: em 10 minutos, por Stephen King – Parte 1: onde o escritor revela como descobriu sua verdadeira vocação.
  2. “Everything You Need to Know About Writing Successfully – in Ten Minutes”: o ensaio original escrito por Stephen King (em inglês).
  3. 22 dicas do mestre Stephen King para escritores e para a vida: mais dicas do Mestre traduzidas e publicadas no StephenKing.com.br.