Eu gostaria de escrever todos os dias. Ainda não consegui. Ou melhor, não consegui escrever ficção. Não ficção é outra história, já que estou sempre produzindo algo: artigos, crônicas, notas irregulares de diário, desabafos (os quais você dificilmente lerá por aqui… ok, este é exceção). Escrever ficção é meu calcanhar de Aquiles.
Em novembro de 2012, eu tentei trabalhar diariamente por 30 dias em um livro de contos; não deu muito certo. Sim, eu estou falando da minha participação no NaNoWriMo (tá chegando, galera!); sim, eu sei que venci o desafio. Mas questão é que trapaceei: não passei o mês todo escrevendo e, por isso, meti-me em algumas maratonas de 4, 5 horas ininterruptas para compensar os dias (uns 6,7) em que fui totalmente relapso.
Em 2014 – é, dois anos depois! – eu comecei a reescrever o tal livro (e ainda o estou reescrevendo); de novo, teimei em fazê-lo todos os dias. Deu certo? Por um (brevíssimo) tempo, sim; nada diferente das inúmeras tentativas anteriores. O fôlego se perde, a vontade pulveriza, a agenda atrapalha, as estrelas desalinham, sei lá, vá entender.
Estabeleça metas, dizem por aí; comece pequeno e aumente aos poucos até pegar o ritmo, eles dizem. E não tentei de tudo? Escrever tantas palavras por dia, tantas páginas por semana, tantos contos ou capítulos por mês. Até utilizei o tal sistema do comediante Jerry Seinfeld (adaptado pelo Diego Schutt do Ficção em Tópicos), mas minha corrente de dias de escrita ficou repleta de falhas.
Toda tática que eu adoto, toda meta que estabeleço começa bem, mas no fim não gera nada além de frustração, ansiedade. Minto. Houve uma, a meta mais desafiadora que já encarei, que rendeu fruto, sim: escrever aquele livro de 50 mil palavras em apenas um mês. Ah, que misto de paraíso e inferno foi aquela época…
Sonho com o dia em que conseguirei escrever diariamente, nem que seja 1 horinha por dia. E não falo de artigos, e-mails de trabalho, desabafos como este, nem bobagens diversas; falo de ficção, de criar tramas, personagens, de contar histórias que mexam com os leitores. Afinal, é por isso que insisto nessa história maluca de ser escritor.
Quero te pedir um favor, meu caro, leitor: deixe-me saber se estou ou não sozinho em minha angustia compartilhando sua experiência nos comentários.
Como você lida com a questão de escrever ou não todos os dias?
Para saber mais:
- Calendário do Escritor: você pode baixar um calendário de escrita gratuito no Ficção em Tópicos, site do parceiro Diego Schutt.
- O desafio de escrever diariamente: de como Kazuo Ishiguro escreveu um romance premiado em 4 semanas.
- Não perca a motivação – 10 dicas para escritores: minha tábua de mandamentos pessoais para os momentos de crise existencial.
- Série 7 coisas que aprendi: página principal do projeto que convida escritores em diversas fases da carreira a compartilharem suas experiências.
Especial NaNoWriMo:
- 30 dias para escrever um livro – saiba mais sobre o evento no primeiro artigo da série sobre o evento.
- As críticas e o valor do desafio – saiba porque o evento é visto com desconfiança por escritores e demais profissionais do mercado editorial.
- Como escrevi um livro em 30 dias – onde detalho minha participação no evento em 2012.
- Diário de escrita – onde falo sobre valor de se manter um diário e compartilho o meu próprio.
- Guia de sobrevivência – dicas para aqueles que ousarem aceitar o desafio!
- National Novel Writing Month: página oficial do evento (em inglês).
Comentários originalmente postados no grupo Escritores ajudando escritores no Facebook:
Ricardo Santos: Escrevo todos os dias quanto estou focado num texto. Mas não escrevo todos os dias do ano. As vezes, preciso de um descanso da escrita pra me concentrar em outras coisas, relacionadas ou não à literatura, como ler um livro atrás do outro, me concentrar em certos estudos, me dedicar a filmes e série e viver um pouco também. 😀
Marlon Machado: Eu percebi que é possível, sim, escrever ficção todos os dias, mas percebi também que é desnecessário. Eu passei um mês sem escrever nada, então comecei uma maratona de escrita, deve ter, sei lá, duas semanas mais ou menos. Eu escrevi todos os dias nessas duas semanas, exceto ontem, que parei pra fazer uma pesquisa e umas leituras. Hoje retomei e foi tudo bem.
Eu conto histórias pra mim mesmo quase todos os dias antes de dormir, então decidi pegar as partes mais “escrevíveis” dessas histórias e tentar produzir algo em cima disso. Todas as vezes que fiz isso foi muito bom. Recomendo muito. Contem histórias para vocês mesmos e então escrevam no dia seguinte – mas corre-se o risco de vocês sofrerem insônia, pois as histórias às vezes ficam muito interessantes. 😀
Eu acho legal isso, o fato de não ter que me preocupar em agradar ninguém quando estou imaginando algo para o meu próprio entretenimento. Acho que a parte mais honesta da sua personalidade se revela nesse momento.
E sobre ser desnecessário, bom, você acaba usando muitas das suas ideias em contos despretensiosos. Existem pessoas que preferem “economizar” as ideias para fazer algo mais caprichado, um livro sério e tal. Eu sou um pouco assim, mas é legal relaxar de vez em quando, escrever pensando mais em você do que nos outros.
Enfim, eu vejo isso de escrever todos os dias como um exercício que pode render frutos interessantes. Não é obrigatório, óbvio, mas você ter prazer fazendo isso. É legal experimentar.
Osmarco Valladão: Eu penso nisso quase o tempo todo, mas escrevo pouco. Como tenho (ainda) boa memória, memorizo trechos longos e depois coloco no papel tudo de uma vez. Quem vê esses momentos fica impressionado, parece que estou criando na hora. Mas na verdade só estou aproveitando de uma característica minha para compensar a falta de disciplina.
O livro Escândalo, de Shusaku Endo, mostra o cotidiano de um escritor japonês de sucesso. Ele vai todo dia para o escritório (ele prefere manter seu trabalho longe de sua vida pessoal), pega uma folha de papel e escreve. Não há uma linha no livro todo sobre o que ele escreve ou de onde vêm as ideias, mas ele senta e escreve. Ok, admito que invejo.
Cristiane Bispo: Osmarco Valladão, sou igual a você: como trabalho, estudo, tenho filho, bom, eu passo meses sem escrever, mas com a história na cabeça; então, numa manhã qualquer, me levanto, pego um copo de café, um cigarro e, pronto, sai tudo. Este estado pode durar uma semana ou mais.
Joe de Lima: Escrever todo dia é uma questão de hábito. Eu tento ter uma visão bastante profissional, quando começo a trabalhar num projeto estabeleço uma marca de pelo menos mil palavras por dia. Nos primeiros dias pode até ser um pouco puxado, dá certo cansaço, mas depois que você acostuma, acaba cumprindo a meta só pelo hábito.
Ler seus posts para mim é tudo de bom! E não se preocupe, não está sozinho nesta empreitada.
No meu caso é praticamente impossível escrever todos os dias. Trabalho em casa, tenho seis filhos, um cachorro e um irmão que mora conosco e todos me solicitam o tempo todo.
Isso sem contar a internet, que alguns já citaram aqui como uma ótima distração. E só para arrematar estou fazendo faculdade de Letras à distância, então já imagina o tamanho dos trabalhos. Apesar disso tudo, tenho um monte de ideias, personagens, contos e etc., tudo dentro da minha cabeça.
Hora para escrever? Nem sei o que é isso. Escrevo o tempo e a hora que dá, seja manhã, tarde, noite ou madrugada. Agora, ficar sem escrever é quase impossível.
Tenho cadernos e mais cadernos… Textos para digitar, para corrigir, para terminar. Livro editado ainda não tenho nenhum, mas prontos, no jeito, uns quatro.
Contando com as historinhas infantis isso já aumenta. Mas amo fazer isso, e deixo de lado qualquer tarefa quando a ideia chega e clama por minha atenção. Acho que esse amor é que nos torna escritores.
Ei, Rosângela.
Sempre fico feliz em ser útil. Adorei seu comentário e me identifiquei com muita coisa, principalmente com a parte de ser solicitado o tempo todo. Mas, ei, ninguém é uma ilha, certo?
De tempos em tempos eu penso também em me inscrever num curso de Letras; tenho a impressão que acabarei cedendo a essa curiosidade. Por ora, eu vou me virando com as oficinas literárias e pilhas e pilhas de livros sobre escrita.
Abraço e continue por aqui. Comentários como o seu são inspiradores.
🙂
O que mais me falta no caso é disciplina, pois quando eu a tenho consigo escrever todos os dias (e procuro ao máximo fazer isso, pois se fico espaçando muito, acabo tendo bloqueio criativo, e até engrenar de novo demora).
O problema é que meu período mais produtivo é de madrugada, entre 23h e 4h, só que durante a semana eu acordo 6h, então não posso fazer esse horário.
Até consigo escrever entre 19h e 23h, mas o problema é que está todo mundo acordado e ficam me interrompendo toda hora (e ninguém vai dormir antes das 22h aqui em casa).
Sem contar a falta de disciplina: a menos que tenha alguma cena implorando para ir para o papel, eu preciso de um tempo para descansar a mente antes de escrever, mas se vou para a internet não saio mais, e se começo um livro não consigo parar.
Entretanto, não vejo problema em um escritor não escrever todos os dias se seu processo criativo não funciona desse jeito. Cada um tem suas peculiaridades e não creio que um escritor se deva forçar a fazer algo que não funciona para ele só porque alguém comentou que é assim que escritores profissionais trabalham.
O importante mesmo é disciplina e frequência (ou seja, se a pessoa se sente bem escrevendo 3 vezes na semana, deve se organizar para que isso se realize sempre).
Ei, Laís.
Que beleza de contribuição! 🙂
Meu horário mais produtivo é no período da manhã. Como você, também necessito de um ambiente tranquilo, silencioso. Concordo quando diz que não se deve forçar um processo que não funciona; o problema é que sou teimoso mesmo. Coisa de virginiano, se você acredita em horóscopo.
Abraço.
Ai, amigo. Tamo junto. Tenho milhares de ideias, tramas e personagens já totalmente construídos na imaginação, porém, sentar e efetivamente escrever é outra história.
São tantas as condições necessárias para isso! Paz de espírito, silêncio, temperatura agradável, umidade do ar… Por outro lado, existem ocasiões em que surge (do nada) algo exigindo ser concretizado naquele mesmo instante, então – não importa o que esteja acontecendo à volta – consegue-se escrever o texto inteiro de uma sentada.
Mas isso é exceção. O normal é como você descreveu. Mas acho que “faz parte”. 😉
Abraço.
Zulmira,
Posso contar nos dedos de uma mão as vezes em que escrevi de uma só sentada um texto que tenha me agradado por completo. Peno muito na reescrita, mas, nas suas palavras, isso também faz parte. 😉
Abraço.
Oi, T.K. De minha parte digo que lido bem mal por não conseguir escrever o que gostaria, de fato, todos os dias.
Também já tentei criar métodos e não estou mais naquela fase na qual lemos sobre escritores que escrevem de pé, em cafés ou hotéis, em chalés isolados ou em meio aos barulhos de uma cidade grande e simplesmente escrevem.
Há muito endeusamento em torno dos escritores, mas eu sempre acreditei que para escrever era preciso, acima de tudo, além de um preparo intelectual “diferente”, um sentimento que misturasse coragem, disciplina, intensidade, desejo puro, necessidade e etc. Mas hoje vejo que cada um tem que passar por isso sozinho (o velho clichê) e escrever do jeito que for possível… métodos não garantem bons livros, mas a disciplina, sim.
Agora, conseguir isso numa época tão cheia de apelos (a Internet é o pior deles) é difícil. Veja que parei de escrever para ler esse post e comentar.
Em todo caso, desejo que você consiga escrever mais. Ah, e pra terminar fico pensando: se os “grandes” vivessem hoje, conseguiriam eles escrever aqueles calhamaços (Crime e Castigo, Guerra e Paz, etc.)?
Acho que estamos, em meio a tanta tecnologia, emburrecendo e nos tornando medíocres. Que eu esteja errada.
Ei, Ana. Primeiro, desculpe a distração. 🙂
Sim, sem dúvida, hoje os desafios à disciplina necessária aos escritores são muitos. Trabalho com tecnologia há pelo menos 10 anos e muitas vezes tenho mesmo a impressão de que, às vezes, ela é mais prejudicial que benéfica. Claro, essa questão também depende do uso que cada um faz das tecnologias, mas essa é uma discussão longa e complexa… e temos que voltar aos nossos textos, certo?
😉
Abraço.