Desafio Vocabular é uma série de breves artigos que coloca o leitor cara a cara com termos pouco usuais do nosso idioma. Ao contrário do que possa parecer, nenhuma das palavras selecionadas foi retirada de dicionários, mas de minhas próprias leituras casuais. Quer participar da brincadeira? Entre em contato.
Sabe o que é IGNOTO? Leia a frase abaixo e veja se descobre o significado dessa palavra.
Quem já não se sentiu meio ignoto na sétima série?
E aí? Descobriu? Provavelmente, não é o que você está pensando. Confira a resposta a seguir.
IGNOTO
Do Dicionário Aurélio:
Adjetivo.
1. V. ignorado.
Do Dicionário Houaiss:
n adjetivo e substantivo masculino
1. que ou o que é desconhecido, não sabido
Se você chegou perto, parabéns; é um grande conhecedor da Língua Portuguesa! Se você errou feio, não se preocupe; é apenas mais um dos meros mortais que se habituam a um vocabulário recorrente.
Que IGNOTO seja sua palavra de hoje. Tente usá-la em uma frase ao longo do dia. Seus amigos o agradecerão pela cultura. Só não vale usar a frase “você sabe o que é IGNOTO?”.
Ah, e não deixe de compartilhar sua frase nos comentários.
Há escritores divididos que não sabem se querem ser autores, críticos literários, blogueiros. A polêmica frase foi parafraseada de um comentário do escritor Raphael Draccon durante uma entrevista concedida ao podcast Ghost Writerem 2012.
À época, vi-me refletindo, não pela primeira vez, sobre meu papel neste cantinho virtual. Atualmente, tais palavras são como uma bussola. Mas é preciso interpretá-las com cuidado, sob o risco de ferirem-se egos sensíveis.
A crítica do autor não trata de classificações, estereótipos, de quem pode ou não considerar-se um escritor. Está bem claro que a mensagem é outra, direcionada especificamente àqueles que abraçaram o desejo de ter trabalhos publicados: o foco é fundamental, afinal, livros não se escrevem sozinhos. Em outras palavras, pare de reclamar da falta de tempo, corte as horas desperdiçadas em baboseiras no mundo virtual ou real, e dedique-se à produção de seu livro.
Draccon não é só conversa, mas um exemplo a ser seguido. Adorado pelos leitores, o escritor mantém um blog pessoal e um site dedicado à trilogia Dragões de Éter. Contudo, é fácil notar que sua presença nestes espaços é ocasional. Não é comum vê-lo publicar posts e mais posts e depois reclamar da falta de tempo para concluir aquele texto em que está trabalhando.
Autores como Eduardo Spohr (A Batalha do Apocalipse) e André Vianco (Os Sete) também se tornam menos acessíveis quando dedicados a um novo projeto – os dois possuem blogs. Por outro lado, há inúmeros casos de escritores que não passam um único dia sem postar algo em seu site, sem acompanhar discussões acaloradas em grupos e redes sociais, disseminar memes bobinhos e polêmicas vazias. São os mesmos que se queixam da correria do dia-a-dia e choram por viver às turras para concluir aquele(s) livro(s) que há anos estão tentando escrever.
O que eles têm que eu não tenho?
Draccon, Spohr, Vianco e outros autores não são seres com poderes paranormais. O dia deles tem vinte e quatro horas como o de todos os demais mortais, e, como estes, eles também tem de lidar com o cotidiano vertiginoso, com responsabilidades de toda ordem, muitas nem um pouco relacionadas à carreira literária. O segredo de seu sucesso é óbvio: eles levam a coisa a sério. Em outras palavras, são escritores profissionais.
Pare de perder tempo e reclamar da vida. Mãos à obra!
Não existe falta, mas si o mau uso do tempo. Alguém que passa horas navegando em sites na Internet, assistindo a filmes repetidos na TV, jogando videogame, e batendo pelada diária com os amigos não poderá reclamar de não ter tempo para escrever. Quando algo é importante de verdade, encontra-se uma forma de dedicar tempo a isto, nem que apenas por alguns minutos ao dia.
Nada disso significa que seja preciso abandonar um blog definitivamente ou nunca mais dar as caras no Facebook ou no Twitter. Pelo contrário, a Internet ainda é o melhor meio de entrar em contato com seu público, divulgar sua obra e angariar novos leitores. Mas se o objetivo é ser um escritor com livros publicados, então às vezes será preciso isolar-se do mundo para se dedicar totalmente à escrita.
Escritor ermitão?
Todos sabem que o oficio de escritor é bem solitário, mas somente quem se pretende a sério como tal abraça este fato. É preciso estar preparado para passar horas diante de uma folha em branco (real ou virtual), tendo como companhia apenas os pensamentos e o desejo de criar.
Não é qualquer um que está disposto a abrir mão de um cineminha ou um dia na piscina do clube só para ficar enfurnado num quarto digitando palavras que talvez ninguém sequer venha a ler um dia. Mas é isso que fazem os escritores profissionais que tem obras publicadas.
O ideal é organizar-se, estabelecer períodos de dedicação exclusiva a este ou aquele projeto. Decida, por exemplo, que pelos próximos dois meses você se dedicará apenas a materializar em livro aquela ideia brilhante que há meses te atormenta.
Foque-se na escrita, custe o que custar: afaste-se das redes sociais, evite peladas e baladas, deixe o blog às moscas.
Uma dica: experimente preparar textos com antecedência, agendando publicações automáticas para seu o período de isolamento; acredite, funciona que é uma beleza.
Para saber mais:
Ghost Writer 6 – Entrevista com Raphael Draccon: escute as sábias palavras do escritor neste episódio do podcast.
Encontrar tempo e um refúgio para dedicar-se à escrita é um desafio. Por isto, é frustrante ver-se diante da página em branco e perceber que não tem sobre o que escrever. Mas há algo ainda pior: passar a semana inteira com uma ideia na cabeça e vê-la tomar chá de sumiço no momento de desenvolvê-la.
Felizmente, isto é mais comum do que parece – que escritor nunca passou por isto? Algumas atitudes simples ajudam a superar este bloqueio: passear, exercitar-se, ler, assistir um filme, encontrar amigos. Particularmente, porém, vejo um problema aí: tais atividades podem ocupar um tempo que deveria ser destinado à escrita, e nada mais.
Uma caminhada na vizinhança pode renovar o espírito e a criatividade, mas de que adiantará se não houver ocasião para escrever no mesmo dia? Nada garante que o bloqueio não voltará amanhã também. O que fazer, então? Não despregar da cadeira até reencontrar aquela ideia perdida? Vasculhar a Internet por um assunto da moda?
Tudo isto é contraproducente (principalmente a Internet): o tempo voará e a angústia apenas aumentará. Há maneiras mais eficientes de superar tal barreira. Pode-se, por exemplo, manter listas de assuntos de interesse e ideias – tratarei disto em outra oportunidade – ou utilizar uma proposta de escrita.
Escreva! Eu o desafio!
Na aula de redação, o professor pede aos alunos que escrevam um texto sobre a preservação ambiental. Na embalagem do achocolatado, a chamada do concurso promete prêmios para o relato de férias mais criativo. Numa brincadeira, amigos desafiam uns aos outros a criar frases contendo determinadas palavras.
Não é preciso ser um escritor profissional para perceber que há propostas de escrita por toda parte. Trata-se, simplesmente, de um tema sugerido sobre o qual se desenvolverão ideias. Este pode se apresentar como combinações de palavras, uma frase, parágrafo, imagens, manchetes de jornal, perguntas, hipóteses, etc.
Uma proposta de escrita é como um gatilho que, disparado, desbloqueia a mente, estimula a criatividade e impulsiona a escrita. O resultado pode ser uma coleção de notas desencontradas e cruas, uma simples descrição, um conto, ou até mesmo um romance. No entanto, isto pouco importa. O objetivo é fornecer um foco e um ponto de partida ao escritor, que pode ater-se à proposta ou extrapolá-la por completo.
Trata-se de um recurso útil que permite escrever sem medo nem inibições. Assim, é estranho que este não seja, aparentemente, tão utilizado por aqui quanto nos países de língua inglesa. E basta uma busca pelas palavras writingprompts para ser direcionado a inúmeras propostas de escrita, em seus diversos formatos. Mas talvez eu apenas não tenha sido feliz na escolha dos termos equivalentes em português.
Atualização (25/03/14): uma tradução mais adequada para writing prompt seria provocação, termo utilizado em algumas oficinas de escrita literária.
Quatro benefícios e um apelo
Em DailyWritingTips, Simon Kewin aponta quatro razões para se utilizar propostas de escrita.
Permitem que a criatividade flua livremente: quando intimidado por uma página em branco, experimente escrever sobre qualquer outro assunto por 10 minutos. Depois retorne ao seu trabalho principal e veja como as palavras surgem naturalmente.
Fornecem material valioso: palavras e ideias podem ser utilizadas num futuro projeto de escrita ou aproveitadas num atual. Não se preocupe se algo parecer cru demais, já que tudo sempre pode ser trabalhado posteriormente.
Desenvolvem o hábito da escrita: encaradas como verdadeiros exercícios, evitam que o escritor seja completamente improdutivo quanto a inspiração faltar.
Promovem a interação em comunidades de escritores: através do compartilhamento das propostas e dos textos resultantes é possível obter avaliações, encorajamento e dicas.
Kewin está absolutamente certo em suas colocações. Tenho comprovado isto no dia-a-dia. As propostas de escrita são um modo eficiente de livrar-se dos bloqueios e devem ser utilizadas. Alguns dos textos que compartilho neste blog nasceram delas, ainda que um ou outro tenha se desviado muito da proposta inicial. Mas o que realmente importa é que desfrutei do tempo reservado à escrita para fazer o que um escritor deve fazer: escrever.
Assim, deixo aqui um apelo aos colegas escritores, aprendizes ou profissionais: façamos mais uso das propostas de escrita. Estimulemos mais nossas mentes com palavras, imagens, música. Vamos desafiar mais uns aos outros, compartilhar e avaliar os resultados, percorrer juntos esta estrada eterna de aprendizado.
E, então, amigo escritor? Topa o desafio de compartilhar suas próprias propostas de escrita?
Para saber mais:
Exercícios de Criação: o site Gambiarra Literária é o que mais se aproxima de um acervo de propostas de escrita em português. Vale a pena conferir.
Duelo de Escritores: a cada 15 dias um tema é proposto aos duelistas, que escrevem e disponibilizam seus textos. O escritor mais bem votado pelo público propõe, então, um novo tema.
Writers Digest, Prompts: propostas de escrita disponibilizadas por uma das revistas sobre escrita mais conceituadas do mundo (em inglês).
Propostas Visuais: propostas acompanhadas de imagens. Site muito bom (em inglês).
Tornar-se um escritor não é trivial. Escrever e ler com regularidade é essencial, obviamente, mas não é o bastante. Para que o aprendizado seja menos árduo, é preciso saber identificar os obstáculos ao longo do caminho e as maneiras de superá-los.
Ainda que este seja um desafio pessoal, certas dificuldades – algumas maiores que outras – parecem ser universais: bloqueios inesperados, falta de inspiração, indisponibilidade de tempo, o abismo entre uma boa ideia e uma boa história, etc. Particularmente, eu luto para derrotar dois destes monstros: as revisões constantes e o medo de ser medíocre.
A revisão é imprescindível. Entre outros benefícios, ela permite identificar e corrigir falhas técnicas. Contudo, antes de revisar um texto, este deve estar completo, nem que seja na forma de um primeiro rascunho. Quando a revisão é feita de outra forma, isto é, sobre um texto inacabado (engavetado ou esquecido), pode ocorrer do autor focar a técnica em detrimento da mensagem ou desviar-se completamente da ideia original. Muito vago? Deixe-me tentar exemplificar.
Eu tive uma ideia para um conto e escrevi o primeiro rascunho por completo. Com a revisão, eu identifico erros ortográficos e gramaticais, trechos mal escritos, orações longas demais, etc. Além disso, surgem novas ideias para aprimorar a própria história – em outras palavras, durante a revisão eu acrescento, modifico ou excluo trechos do texto.
Tais alterações não seriam um problema, pois, por mais que as fizesse, eu já teria os principais pontos do conto em mãos e saberia aonde este deveria chegar. Contudo, ao revisar um texto inacabado corre-se o risco, por exemplo, de uma história ser modificada infinitamente; assim, uma miríade de universos alternativos nasceria e morreria prematuramente sem que o autor jamais concluísse seu trabalho.
“Estamos reunidos aqui hoje para revisar de uma vez por todas essa História Sem Fim!”
Ainda muito confuso? Eis outro exemplo, mais simples: eu tenho alguns contos inacabados separados em arquivos digitais onde coexistem diversas cópias pós-revisões; ao ler as versões 1 e 10 de, digamos, A Loura do Pontilhão, o leitor jamais imaginará que a última é fruto de 9 revisões anteriores de um rascunho inacabado – e que assim permanece até hoje.
Ao jamais revisar um texto antes de concluir um rascunho completo, como supracitado, eu superei esta barreira. Este hábito funciona bem ao escrever textos pequenos, como contos e artigos para o blog. Mas e quem está escrevendo um livro? Ainda não me atrevi a tanto, então eu não posso dizer com segurança. Contudo, imagino que uma boa prática seria:
Traçar um rascunho geral e pouco detalhado de todo o livro, dividindo em partes.
Dedicar-se ao desenvolvimento do rascunho de toda uma parte.
Tendo concluído aquela parte, revisá-la algumas vezes antes de seguir em frente.
Repetir os passos 2 e 3 até que todo o livro tenha sido escrito e revisado.
Com o livro concluído, partir para uma revisão geral.
Talvez não seja o método ideal para desenvolver um livro completo, mas é o que eu adotaria se fosse louco o bastante para fazê-lo neste momento. Eu recomendo que os aprendizes busquem conselhos de autores conceituados ou de escritores mais experientes.
Tenham em mente que aqui sou tão aprendiz quanto qualquer um. Ao compartilhar minhas dificuldades e o modo como lido com estas, eu espero auxiliar outros aprendizes de escritor (ou aspirante a autor, como ouvi outro dia num podcast). Espero, ainda, que outros compartilhem suas dificuldades de modo que possamos todos aprender um com os outros.
E como este texto já está relativamente grande, eu falarei sobre o medo de ser medíocre em outra oportunidade.
Para saber mais:
Metodologia 5+10: 5 regras e 10 orientações flexíveis que busco seguir em meu caminho para tornar-me um escritor.
Escrever um livro – Cinco obstáculos a eliminar: tradução de um artigo em francês excelente; trata da inércia, do medo, da falta de tempo, da motivação vacilante e do comprometimento impreciso.