Este é o segundo de 30 artigos sobre construção de mundos escritos por Stephanie Cottrel Bryant e traduzidos por muá, Diogo Ruan Orta. Publicado em 2007 para participantes do NaNoWriMo, este tutorial prático e baseado em livros sobre o tema permanece uma ferramenta útil.
Ontem montamos uma listinha com tipos de climas e palavras que evocassem sensações associadas a eles. Hoje pensaremos em como esses climas poderão impactar a sua história. Pegue seu caderno e um relógio aí e separe alguns minutinhos para a leitura e o exercício do dia.
Decidi escrever um livro. De fantasia. Não posso (nem quero) dizer muito sobre ele, mas posso falar sobre COMO estou escrevendo. Este site é todo sobre processos, afinal, certo? Tive uma ideia e a estou desenvolvendo, mas quero focar no que interessa, a minha preocupação mais recorrente: como construir um mundo fantástico?
Hoje inicio uma série de 30 artigos sobre o assunto. Eu não escrevi essas dicas, mas elas me ajudaram bastante e talvez sejam úteis pra você também. Esse tutorial foi escrito para participantes do NaNoWriMo – é, o tal desafio de escrever um livro em 30 dias do qual que o chefe se gaba por aí de ter vencido.
Ontem fez um ano que fui convidado a escrever sobre meu processo criativo no 2 mil toques, projeto do amigo escritor André Timm. Tudo o que eu disse ali ainda é verdade, mas achei que valia a pena dar uma incrementada. Então vamos lá…
Você não leu o texto publicado no 2 mil toques? Confira meu processo criativo.
Quem acompanha o Escriba Encapuzado deve ter notado que tanto o chefe quanto eu estamos sumidos daqui. O T.K. tem uma boa desculpa – férias na Tailândia, tá?! –, mas eu… bem, digamos que eu ando meio pra baixo com esse lance de escrita.
Como o drama de uns é pode ser a inspiração de outros, eu dei uma pesquisada por aí e montei essa listinha de atitudes positivas para escritores em crise. Não sei se vai resolver meu problema, mas vai que ajuda algum leitor, não é? Nunca se sabe.
Confira a seguir 8 dicas para ser um escritor mais feliz.
1 – Escreva
O escritor que não escreve definha. A abstinência de palavras machuca. Angústia, ansiedade, desorientação, frustração são alguns sintomas que podem se manifestar por dias, meses, anos. O tratamento é um só: escrever. Não importa se diário, artigo, crônica, conto, romance, roteiro ou uma bobagem qualquer que apenas os mais íntimos lerão. Preencha o vazio interior com palavras.
Escritor que escreve é mais feliz.
2 – Relaxe
Ao escrever, o escritor se esforça para fazer o melhor possível, sempre. Ele não está disposto a aceitar menos do que o melhor. Mas nem sempre isso é possível. Então, preocupe-se menos. Ninguém precisa acertar de primeira. Se o texto está ruim, bem diferente do que tinha em mente, relaxe e curta o processo de ver, pouco a pouco, um rascunho ruim se transformando em um material digno.
Não precisa ser zen, basta saber relaxar.
3 – Permita-se
O escritor deve ser leal aos seus desejos. Literatura de entretenimento é irrelevante? Contos não vendem? Ninguém lê poesia? Dane-se. Escreva o que quiser e como quiser. Não tente se adequar a padrões, a modinhas nem a nada que não lhe desperte paixão. A vida é curta, o tempo escasso, a carreira de escritor não remunera tão bem, portanto, permita-se.
Escreva o que você quiser escrever.
4 – Simplifique
Escrever o grande romance brasileiro, a trindade fantástica, a série adaptada para o cinema. Quem nunca sonhou com isso? Todo escritor é um pouco megalomaníaco. Não há nada demais nisso, mas é preciso cautela, certo grau de organização e bom senso. Para evitar frustrações, estabeleça metas realísticas, curtas e controláveis – “ter o original aceito por uma editora até…” é um ótimo contraexemplo.
Simplificação: você está fazendo isso errado!
5 – Foque
Conhecer as engrenagens do mercado editorial é útil? Sim. É preciso pautar seu trabalho por elas? Não deveria. Preocupe-se em escrever o que você quer escrever, dê o seu melhor. Somente quando tiver um produto em mãos (sim, o livro é arte, mas também é produto) veja como utilizar a máquina a seu favor. Como escritor seu foco deve ser sempre escrever; eventualmente a publicação virá.
Às vezes isolar-se do mundo é necessário.
6 – Desapegue
Não se preocupe com números: vendas, ranques, acessos, curtidas, compartilhamentos; um escritor em início de carreira não deveria condicionar sua felicidade a nada disso. O que é mais importante? Feedback. De que vale uma página com dezenas de milhares de seguidores que não se manifestam quando você publica ali um novo conto ao qual se dedicou tanto?
Caderno, lápis e uma ideia. Do que mais um escritor precisa?
7 – Motive-se
Dinheiro é importante? Óbvio! Ele deve ser seu objetivo final? Nunca. Todo escritor quer viver de seu ofício, mas não deixe que este desejo seja sua motivação para escrever. Escreva pelo gosto de contar histórias, para tornar o mundo melhor, por acreditar que tem algo a dizer, para não enlouquecer, escreva porque sim. Mas ame o ofício, não o dinheiro.
Café, uísque, tanto faz… recompense-se por um serviço bem feito.
8 – Termine
Começou? Vá até o fim. Não terminar é desistir, é ceder ao medo, à insegurança. Um escritor morre um pouco a cada texto abandonado: sonhos são sufocados, a alma é ferida por culpa, angústia, tristeza. Por pior que seja, um trabalho concluído te preenche de satisfação, te motiva a prosseguir, te deixa feliz. Afinal, nenhum texto será pior do que aquele que você nunca terminou.
Desenvolva, desde cedo, o hábito de terminar (ok, nem tanto).
E aí? Você é um escritor feliz? Quer acrescentar algo? Comente!
Em 1986*, o já fenomenal escritor norte-americano Stephen King publicou na revista The Writer um ensaio sobre como se tornar um escritor de sucesso… em 10 minutos. Pretensioso, não?
Para celebrar o lançamento do livro Sobre a Escrita – A Arte em Memória no Brasil, o Escriba Encapuzado traz o ensaio devidamente traduzido. Na primeira parte, publicada ontem, King revela como despertou para sua vocação.
A segunda parte você confere agora: o Mestre do Terror e do Suspense (e também da Fantasia, por que não?) apresenta conselhos que prometem transformar aspirantes atenciosos em escritores de sucesso.
Confira agora as 12 dicas de Stephen King para escritores iniciantes.
Tudo o que você precisa saber sobre escrever com sucesso: em dez minutos (Parte 2)
por Stephen King
Então aqui está, sem lenga-lenga. Levará 10 minutos para ler, e tudo pode ser aplicado agora mesmo… se você escutar.
1. Seja talentoso
Este, claro, é o matador. O que é talento?, eu escuto alguém bradando, e aqui estamos nós, prontos para entrar em uma discussão equivalente a de “qual é o sentido da vida”? repleta de declarações pomposas e inutilidade total. Para os propósitos do escritor iniciante, talento pode muito bem ser definido como sucesso eventual – publicação e dinheiro. Se você escreveu algo pelo qual alguém lhe enviou um cheque, se você o cheque tinha fundos e você o descontou, e se você pagou a conta de luz com o dinheiro, eu te considero talentoso.
“Cadê aquele anormal bronco e ganancioso?”
Agora alguns de vocês já estão berrando. Alguns de vocês estão me chamando de anormal bronco e ganancioso. E alguns de vocês estão me chamando por palavrões. Você está dizendo que Harold Robbins é talentoso?, guincha alguém num dos Grandes Departamentos de Inglês da América. V.C. Andrews? Theodore Dreiser? E quanto à você, seu palerma disléxico?
Absurdo. Pior que absurdo, descontextualizado. Não estamos falando de bom ou ruim aqui. Eu estou interessado em te contar como publicar suas coisas, não em julgamentos críticos de quem é bom ou ruim. Em regra, os julgamentos críticos chegam depois que o cheque é gasto, afinal. Tenho minhas próprias opiniões, mas a maior parte do tempo eu as mantenho para mim mesmo.
Pessoas que são publicadas regularmente e são pagas pelo que estão escrevendo podem ser santos ou diabretes, mas é claro que eles estão alcançando muito mais pessoas que querem o que eles oferecem. Logo, eles estão se comunicando. Logo, eles são talentosos. A maior parte de escrever com sucesso é ser talentoso, e no contexto do marketing, o único escritor ruim é aquele que não é pago. Se você não é talentoso, você não terá sucesso. E se você não está tendo sucesso, você deve saber quando desistir.
Quando é o momento? Não sei. É diferente para cada escritor. Não após escorregar em seis rejeições, certamente, nem após sessenta. Mas após seiscentas? Talvez. Após seis mil? Meu amigo, depois de seis mil canetadas vermelhas, já passou da hora de você tentar pintura ou programação de computadores.
2. Seja organizado
Datilografe. Espaço duplo. Use um papel branco pesado bonito, nunca aquela coisa apagável de pele de cebola. Se você rasurou seu rascunho demais, faça outro.
3. Seja autocritico
Se você não rasurou seu rascunho demais, você fez um trabalho porco. Apenas Deus acerta na primeira vez. Não seja preguiçoso.
4. Remova cada palavra extrínseca
Você quer subir em um palanque e pregar? Ótimo. Arranje um e tente o parque local. Você quer escrever pelo dinheiro? Vá direto ao ponto. E se você remover todo o lixo excessivo e descobrir que não conseguiu chegar ao ponto, então rasgue o que escreveu e recomece… ou tente algo novo.
5. Nunca leia um livro de referencia enquanto estiver trabalhando num primeiro rascunho
Você quer escrever uma história? Ótimo. Largue o dicionário, a enciclopédia, seu Almanaque Mundial e o tesauro. Melhor ainda, jogue o tesauro na lixeira. A única coisa mais assustadora do que um tesauro são aqueles livretos que universitários compram perto das provas por serem preguiçosos demais para ler os romances indicados. Qualquer palavra que você tenha que caçar no tesauro é a palavra errada. Não há exceções a essa regra.
Você acha que pode ter errado alguma palavra? Tudo bem, eis as suas escolhas: procurar pela palavra no dicionário, assegurando-se de tê-la escrito corretamente – e em troca quebrar sua linha de pensamento e o arroubo de escritor– ou só soletrá-la foneticamente e corrigir depois.
Por que não? Você achou que estava indo a algum lugar? E se você precisar saber qual é a maior cidade do Brasil e perceber que não a tem em sua cabeça, por que não escrever em Miami ou Cleveland? Você pode conferir… mas depois. Quando você sentar para escrever, escreva. Não faça nada mais além de ir ao banheiro, e apenas quando for absolutamente inadiável.
6. Conheça os mercados
Apenas alguém estúpido enviaria uma história sobre morcegos-vampiros gigantes assolando uma escolar para a revista McCall. Apenas alguém estúpido enviaria uma história tenra sobre mãe e filha acertando as diferenças na véspera de Natal para a Playboy… mas sempre há quem faça isso. Não estou exagerando; vi essas histórias nas pilhas de baboseiras de revistas atuais.
Se você escreve uma boa história, por que enviá-la de modo boçal? Você mandaria sua criança para fora numa tempestade de neve vestindo bermudas e uma camiseta sem mangas? Se você gosta de ficção científica, leia revistas do gênero. Se você quer escrever histórias de confissão, leia revistas do gênero. E por aí vai.
Não se trata apenas de conhecer o que é cabe na história atual; com o tempo você pode começar a perceber ritmos gerais, gostos e aversões editoriais, toda a inclinação da revista. Às vezes as leituras podem influenciar sua próxima história e gerar uma venda.
7. Escreva para entreter
“Não estão se divertindo?!”
Isso significa que você não pode escrever “ficção séria”? Não. Em algum lugar ao longo do caminho, críticos perniciosos passaram a impor aos leitores e escritores americanos a noção de que ficção de entretenimento e ideias sérias não se sobrepõem. Isso surpreenderia Charles Dickens, para não dizer Jane Austen, John Steinbeck, William Faulkner, Bernard Malamud, e centenas de outros. Mas suas ideias sérias devem sempre servir a sua história, não o contrário. Repito: se você quer pregar, arrume um palanque.
8. Pergunte-se frequentemente, “Estou me divertindo?”
A resposta não precisa ser sempre sim. Mas se é sempre não, é hora de um novo projeto ou uma nova carreira.
9. Como validar críticas
Mostre seu texto para um número de pessoas – dez, digamos. Ouça atentamente o que eles dizem. Sorria e acene muito. Em seguida, reveja o que foi dito com muita atenção. Se os seus críticos estão dizendo a mesma coisa sobre algum aspecto de sua história – uma reviravolta na história que não funciona, um personagem que soa falso, uma narrativa empolada, ou meia dúzia de outros possíveis –, mude esse aspecto.
Não importa se você realmente gostava da reviravolta de tal personagem; se um grande número de pessoas está dizendo que algo está errado com seu texto, então está. Se sete ou oito delas estão criticando a mesma coisa, eu ainda sugeriria mudá-la. Mas se todos – ou a grande maioria – criticou coisas diferentes, você pode desconsiderar o que todos dizem.
10. Conheça todas as regras para a devida submissão
Porte de retorno, envelope auto-endereçado, essas coisas.
11. Um agente? Esqueça. Por ora.
Quem nunca?
Agentes recebem 10% do dinheiro ganho por seus clientes. 10% de nada é nada. Agentes também precisam pagar aluguel. Escritores iniciantes não contribuem para isso nem para qualquer outra necessidade da vida. Venda suas histórias por conta própria. Se já concluiu um romance, envie cartas de apresentação para editores, um a um, acompanhadas de capítulos de amostra e/ou do original completo.
E lembre-se da Primeira Regra de Stephen King Sobre Escritores e Agentes, fruto de amarga experiência pessoal: você não precisa de um agente até que esteja ganhando o suficiente para alguém roubar… e se estiver ganhando tanto, você será capaz fazer uma seleção de bons agentes.
12. Se for ruim, mate.
No que diz respeito a pessoas, assassinato por piedade é contra a lei. No que diz respeito a ficção, esta é a lei.
Isso é tudo o que você precisa saber. E se você ouviu, você pode escrever qualquer coisa que quiser. Agora creio que vou desejar-lhe um dia agradável e assinar.
Meus dez minutos acabaram.
* Acredita-se que o ensaio original tenha sido publicado em 1986 em uma das edições da The Writer Magazine e posteriormente republicado na edição de 1988 do The Writer’s Handbook. O texto é claramente a base do que se tornaria o livro Sobre a Escrita – A Arte em Memórias.
E aí, você achou válidas as dicas do Rei? Dê sua opinião nos comentários.
Stephen King, Mestre do Terror e do Suspense, autor de mais de 50 romances, centenas de contos, uma porção de novelas, poemas, ensaios e livros de não ficção. Imagine o quanto um escritor iniciante pode aprender com uma fera dessas.
Agora pare de imaginar, corra até a livraria mais próxima e garanta seu exemplar de Sobre a Escrita – A Arte em Memória, livro que é tanto uma autobiografia de King quanto um manual de conselhos para quem quer escrever.
Para celebrar o lançamento (com 15 anos de atraso) do livro no Brasil , o Escriba Encapuzado publica um valioso ensaio escrito pelo próprio Mestre em 1986 para as páginas da revista The Writer.
Para facilitar a leitura, o texto foi dividido em duas partes: na primeira, o escritor revela como descobriu sua vocação para a escrita; na segunda, a qual será publicada amanhã, ele lista 12 conselhos que te ajudarão a ser um escritor de sucesso.
Confira a seguir a primeira parte do ensaio.
Tudo o que você precisa saber sobre escrever com sucesso: em dez minutos (Parte 1)
por Stephen King
I. A Primeira Introdução
É ISSO AÍ. Sei que até parece um anuncio de uma vil escola de escritores, mas eu vou mesmo contar tudo o que é preciso para que você busque uma carreira de sucesso e financeiramente gratificante escrevendo ficção, e vou mesmo fazê-lo em dez minutos, exatamente o tempo que levei para aprender. Na verdade, você levará cerca de vinte minutos para ler este ensaio, mas só porque preciso te contar uma história, e depois preciso escrever uma segunda introdução. Mas esse tempo não deve ser contabilizado nos tais dez minutos.
II. A História, ou, Como Stephen King Aprendeu a Escrever
Quando eu estava no colegial, fiz o que é esperado de colegiais arteiros: meti-me numa típica enrascada colegial. Eu escrevi e publiquei um jornalzinho satírico chamado O Vômito da Aldeia. Num artiguinho, satirizei alguns professores do Colégio Lisbon (no Maine), onde eu estudava. Não foram sátiras muito gentis; elas variavam do escatológico à crueldade pura.
Eventualmente, uma cópia do jornalzinho chegou às mãos de um membro do corpo docente, e como eu havia sido imprudente o suficiente para colocar o meu nome ali (erro do qual ainda não me recuperei completamente, afirmam alguns críticos), eu fui levado à secretaria. Àquela altura, o zombador sofisticado já tinha voltado a ser o que era: um moleque de quatorze anos que tremia nas botas e imaginava se levaria uma suspensão… que nós chamávamos de “férias de três dias” nos indistintos idos de 1964.
Eu não fui suspenso. Fui forçado a pedir algumas desculpas – todas devidas, mas ainda assim eram como cocô de cachorro em minha boca – e a passar uma semana na sala de detenção. E o orientador providenciou o que, sem dúvida, ele pensou ser um canal mais construtivo para meus talentos.
Tratava-se de um emprego – condicionado à aprovação do editor – escrevendo sobre esportes para o Lisbon Enterprise, um desses semanários de doze páginas com os quais qualquer morador de cidade pequena estará familiarizado. O tal editor foi o homem que me ensinou, em dez minutos, tudo o que sei sobre escrever. O nome dele era John Gould – não o famoso humorista da Nova Inglaterra nem o romancista que escreveu The Greenleaf Fires, mas um aparentado de ambos, eu creio.
Ele me contou que necessitava de um escritor de esportes e que nós poderíamos “testar um ao outro”, se eu quisesse.
Eu contei a ele que sabia mais sobre álgebra avançada do que sobre esportes.
Gould assentiu e disse, “Você aprenderá”.
Eu disse que pelo menos tentaria aprender. Gould me deu um imenso rolo de papel amarelo e prometeu um ordenado de meio centavo por palavra. As duas primeiras peças que escrevi tratavam de uma partida de basquete colegial no qual um membro da equipe da minha escola quebrou o recorde de pontuação do Colégio Lisbon. Uma dessas peças era pura reportagem. A segunda era um artigo.
Eu levei ambas para Gould no dia seguinte ao jogo para que ele pudesse colocá-las no jornal, o qual saia às sextas-feiras. Ele leu a peça objetiva, fez duas pequenas correções, e meteu nela uma tachinha. Então ele partiu para o artigo com uma grande caneta preta e me ensinou tudo o que eu necessitava saber sobre meu oficio. Quisera eu ter ainda a tal peça – ela merece ser emoldurada, mesmo com as correções editoriais –, mas consigo recordar muito bem como ela ficou depois que Gould terminou.
Eis um exemplo:
(após as marcas editoriais indicadas na cópia original de King)
Na noite passada, no popular ginásio do Colégio Lisbon, partidários e fãs de Jay Hills foram surpreendidos por um desempenho atlético sem precedentes na historia da escola: Bob Ransom, também conhecido por Bob “Bala” tanto por seu tamanho quanto por sua precisão, marcou trinta e sete pontos. Ele pontuou com elegância e velocidade… e também com uma estranha cortesia, cometendo só duas faltas em sua busca cavaleirosa por um recorde que escapava aos atletas de Lisbon desde 1953…
Quando Gould terminou de rasurar minha cópia como indicado acima, ele olhou para cima e deve ter visto algo em meu rosto. Creio que ele pensou ser horror, mas não era: era revelação.
“Eu só removi os trechos ruins, sabe”, ele disse, “A maior parte está muito boa”.
“Eu sei”, eu disse, concordando com as duas coisas: sim, a maior parte daquilo era boa, e sim, ele apenas havia removido as partes ruins. “Não farei de novo”.
“Se isso for verdade,” ele disse, “você nunca precisará trabalhar de novo. Você pode viver disso.” Então ele jogou a cabeça pra trás e gargalhou.
E ele estava certo; estou vivendo disso, e enquanto continuar vivendo, eu espero nunca ter que trabalhar de novo.
III. A Segunda Introdução
Tudo o que se segue já foi dito antes. Se você se interessa o bastante por escrita para ser um comprador desta revista*, você já terá escutado ou lido (quase) tudo isso antes. Milhares de cursos de escrita são ministrados pelos Estados Unidos todos os anos; seminários são constituídos; conferencistas convidados falam, respondem perguntas, bebem o tanto de gin e tônica que suas diárias permitem, e tudo se resume ao que se segue.
Eu vou te contar essas coisas de novo porque as pessoas normalmente só escutam – escutam de verdade – alguém que ganha muito dinheiro fazendo a coisa da qual ele está falando. É triste, mas é verdade. E te contei a história acima não para soar como um personagem saído de um romance de Horatio Alger, mas para estabelecer um argumento: vi, escutei, e aprendi.
Até aquele dia no pequeno gabinete de John Gould, eu escrevia primeiras versões de histórias que ultrapassariam 2.500 palavras. As segundas versões chegariam às 3.300 palavras. Depois daquele dia, as primeiras versões de 2.500 palavras se transformaram em segundas versões de 2.200 palavras. E dois anos mais tarde, eu vendi meu primeiro livro.
Amanhã: a segunda parte com 12 dicas de Stephen King para ser um escritor de sucesso.
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